sábado, 23 de março de 2013

Primavera - MQ

 
Sentado no jardim, junto à estrada, espero a Primavera
Espero pelo que não sei e nem quero adivinhar
Escondo o rosto com a palma das mãos e respiro fundo como quem desespera
Faltas-me tanto, falta-me a vida, falta-me o ar
 
Uma saudade de ser menino, das velhas canções de amor
Dos serões passados em abraços espinhosos e lágrimas ao partir
Dos sonhos inquietos, das noites mal passadas de calor
Do teu leito assombrado de ansiedade, do medo de cair
 
Tenho uma vontade imensa de fugir, com fulgor, em direcção ao vazio
Queria perder-me novamente no eco do teu abraço
Desejo tanto partir de novo em busca do caminho, uma montanha, talvez um rio
Queria perder-me novamente na pureza do teu regaço
 
Sentado no jardim, junto à estrada, espero e quase adormeço
Vou seguindo a vida com os olhos como quem vê passar um navio
Já não me recordo quem fui, desta vida me despeço
Vou percorrendo a estrada, fumo um cigarro, visto o casaco, tenho frio


Primavera by MQ

quinta-feira, 14 de março de 2013

Os Subterrâneos - Jack Kerouac

Já ninguém escreve assim! Já ninguém consegue usar e abusar das palavas, como se fossem um prolongamento da alma ou coisa que o valha.

Acabei neste momento preciso e precioso de ler “Os Subterrâneos” do vagabundo cavaleiro criador, Jack Kerouac e sinto-me completamente inebriado e enevoado.
 
Não sei o que pensar do que acabei de ler. Não consigo articular correctamente os pensamentos. Sinto-me completamente dormente e fascinado.

Não, não é a primeira vez que leio Jack Kerouac! Mas é a primeira vez que leio uma coisa assim!

Este livro foi escrito em três noites seguidas e como combustível o Pai da beat generation usou álcool e comprimidos de benzedrina. O resultado está a vista e é impossível ficar indiferente à forma como nos é contada uma invulgar história de amor entre Leo (Kerouac) e Mardou.

Uma enxurrada de frases, pensamentos e improvisos ao bom estilo bop do Jazz dos anos cinquenta, no contexto único da geração literária subterrânea do pós-guerra.

Impossível de classificar. Só lendo e, ao terminar, fechar o livro e dizer: “Foda-se, este gajo é brilhante”. Depois é deixar a energia sair dos poros como transpiração e voltar ao mundo real.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Na Outra Margem, Entre as Àrvores - Ernest Hemingway

De romance a grande romance vai uma distância gigante. Apenas os mestres ou os grandes génios da literatura conseguem conceber duma só vez um livro para a eternidade.

Ernest Miller Hemingway é um exemplo dessa grandiosidade e magia e, por muito mal amado e criticado que tenha sido como homem, deixará uma obra singular como escritor para as gerações futuras.

“Across the River and into the Trees” é infeliz e estupidamente um dos livros mais criticados de Papa Hemingway, no entanto, após duas tardes bem passadas na sua companhia, achei impossível não admirar a pureza e crueza da sua escrita. Ontem, hoje e amanhã.

Uma dessas tardes foi há onze anos atrás, em pleno verão. Uma esplanada, logo a seguir ao almoço, sol escaldante e gin tónico. Algumas horas depois fechei o livro, olhei fixamente um ponto perdido no meu horizonte, deixei-me levar pela brisa do fim de tarde e sonhei com Veneza.

Há duas semanas atrás, a curar o cansaço de uma semana de trabalho, decidi reler este romance (nunca vou conseguir explicar porquê). Desta vez na esplanada da Mexicana, num Sábado à tarde, onde me perdi de novo a recordar e folhear as páginas que descrevem as últimas horas da vida do Coronel Richard Cantwell. Como se fosse a primeira vez.

Quando terminei a jornada de reler esta obra prima maldita e injustiçada apeteceu-me deitar-me num trilho de terra batida e adormecer, esquecer-me de tudo, em paz, na outra margem, entre as árvores.